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09 September 2009

Concurso «Componha Uma Campanha»

Durante a campanha de Obama, certo cronista do Público, cujo nome não lembro (Laurence Peter definiu originalidade precisamente como esta habilidade de nos recordarmos das coisas, mas não dos seus autores), escreveu a propósito de como os políticos na Europa estavam a tentar aproveitar o fenómeno Obama para renovar a sua imagem, explicando que, mais do que ser Obama, havia que parecer Obama. A campanha do presidente americano apresentou de facto um novo modo de estar e sobretudo fazer política, inevitavelmente clonado sem gosto, como um pechisbeque, agora que entramos em ano eleitoral.
O PSD foi, de todos os partidos, o que mais abertamente explicitou o seu desejo de abandonar o modo velho de política, afirmando – e até com razão – o carácter eminentemente passadista dos comícios. Seguindo Obama, os sociais-democratas lançaram uma forte ofensiva na internet. Mas porque quanto Portugal importa, traduz em calão (Eça dixit), os candidatos laranja às Europeias chegam alguns deles, na sua ânsia de mostrar modernidade, a ter links para o seu Hi5, a rede social de putos e adolescentes. Faz lembrar aquele conferencista da anedota que, convidado para uma sessão solene, procurando infundir um tom elevado ao discurso, em vez de dizer, com simplicidade, «as folhas da couve», acabou a louvar «as pétalas» do vegetal.
Também o PS procura tirar dividendos do fenómeno Obama: num dos seus tempos de antena, são exibidas várias fotos de Sócrates com o presidente americano, não se percebe bem porquê. Se bem me recordo, o candidato do PS é Vital Moreira, não o primeiro-ministro (antes fora: sinal que nos deixava!). Quiçá as imagens sejam uma referência à contratação para as Legislativas, por parte de Sócrates, da empresa que preparou o lado multimédia da campanha de Obama. Na impossibilidade de imitar o conteúdo, imita-se o estilo. Falta ao PS – e à nossa política em geral – o discurso de verdade sobre o qual Obama ergueu a sua vitória.
Estude-se o que aconteceu entre nós com a sugestão de criação de um imposto europeu, avançada por Vital Moreira. Pouco me importa aqui a ideia em si, antes a tomo como exemplum da construção da mensagem política. Vital Moreira, servente fiel de Sócrates, é, apesar de tudo, inteligente demais para não ter opiniões próprias: ei-lo pois a sugerir a criação de um imposto europeu. As hostes rosa perceberam rápidas o erro da coisa e, no dia seguinte, depois de todas as críticas de que fora alvo, Vital Moreira, em obediência aos estrategos de campanha, calou o que pensava e remeteu explicações para quando fosse eleito (belo pensamento: colhe o voto, explica depois). Mais tarde, porém, pôde retomar o assunto, fazendo notar que o PSD já antes havia aprovado a ideia. A máquina socialista não dormiu enquanto não conseguiu tornar o deslize do seu candidato em arma de arremesso, dando-lhe, depois disso, autorização para falar de novo.
Vê-se bem nisto que o discurso do poder é todo ele imagem, uma coisa fabricada que, quando interrompida pela honestidade, se acanha e panica. Vital, o candidato «independente», enquanto títere do governo, é, sem dúvida, o mais constrangido de todos os cabeças-de-lista (está claramente proibido de dizer o que pensa de Durão Barroso, por exemplo). Entende-se, face a esta sensação de farsa, porque razão a abstenção prevista é tão grande. Confrontados com a proposta de tornar o voto obrigatório, os partidos manifestaram-se unanimemente contra. É fácil desmanchar a aparente contradição entre este seu repúdio e o cerrado combate que têm travado contra a prevista abstenção. Com o voto obrigatório, a abstenção de hoje redundaria num gigantesco número de votos nulos/em branco, vexame ingrato de toda a classe. Os políticos estão apenas a proteger-se a si próprios – é a sobrevivência da espécie: pois não é este o ano Darwin?

14 December 2007

Mulheres Seminuas e Verdades Cruas


A Juventude Socialista (JS) tem um novo outdoor. O objecto, espreguiçado por alguns amargurados metros quadrados, proclama pomposo sobre um fundo azul: “Desde 2005 mais de 54.300 estágios profissionais”. No canto inferior direito, ao lado de uns bonequinhos coloridos e dançantes, lê-se: “O futuro já começou”. A ocupar o lado esquerdo do cartaz, há um rapaz contente, abraçando pela cintura uma loira e uma morena. Dalguma forma, este outdoor é o símbolo final da política moderna. Passo a explicar.

Os partidos, sob recomendação do omnívoro capitalismo, converteram-se em empresas. As declarações de Menezes na semana passada, defendendo que o PSD deve “profissionalizar-se, passando a funcionar como uma empresa”, constituem uma imaculada expressão do tempo presente. Tendo um produto a vender – o programa político –, a empresa-partido recorre ao marketing para o divulgar junto dos clientes e consolidar a sua posição no mercado: assim se explica o outdoor da JS, a meio do mandato do mandão Sócrates, louvando as “vitórias” do executivo rosa. Mesmo aqueles sem qualquer formação na área da publicidade não ignoram que, numa sociedade infantilmente sexual como a nossa, a presença de uma figura feminina atractiva num anúncio é um artifício popular para promover o produto – exemplo disso é a última e parva campanha da TV Cabo, em que os serviços oferecidos pela empresa surgem encarnados em três raparigas que se querem de boas formas curvas. No outro dia, de resto, indo às compras com um amigo meu, até nas embalagens de queijo encontrámos uma imagem de uma mulher em biquini. Seguindo pois os mais eficazes métodos da publicidade, a JS, como boa empresa, resolveu colorir o cartaz com a já mencionada imagem do rapaz feliz em dupla companhia feminina. O partido que foi responsável pela criação, no tempo de Guterres, de um Ministério para a Igualdade, cola pelo país outdoors de um explícito machismo, denegrindo a mulher à condição de produto físico. Graças a Deus que os partidos não têm vergonha.

Empresas que são, necessitadas de vender, os partidos recorrem, para alargar a sua quota de mercado, a par e par com as mulheres seminuas, às semi-verdades, quando não mesmo à mentira. Isso, de resto, é uma prática comum nesse habitat: Durão Barroso veio ainda recentemente declarar sobre a famigerada Guerra do Iraque que “houve informações que me foram dadas, a mim e aos outros, que não corresponderam à verdade” – antes que Durão o tivesse reconhecido, já a realidade o confirmara há muito, infelizmente. O cartaz da JS obedece a estas técnicas de ocultação da verdade, amigas da publicidade. Eufóricos, os pupilos socialistas rejubilam com as medidas em prol dos jovens (dizem no seu site), com os 54.300 estágios (!) profissionais do cartaz. Esquecem deliberadamente os dados recentemente revelados pelo Instituto Nacional de Estatística. Segundo este, a taxa de desemprego – que se situa já nos 7,9% - subiu entre aqueles com menos de 35 anos. De acordo com a mesma fonte, a grande maioria dos 106 mil empregos que o governo reclama ter criado, por exemplo, só foram possíveis graças ao acentuado crescimento dos contratos a prazo: os contratos sem termo, pelo contrário, reduziram-se. Seria contudo estranho pedir aos jovens outro comportamento, quando o governo do seu próprio partido envereda pelas mesmas tácticas. Ainda na sexta, o Tribunal de Contas veio denunciar como, através de uma metodologia manhosa, o Ministério da Saúde apresentou resultados assaz positivos, quando, na realidade, a situação do Serviço Nacional de Saúde se deteriorou. E estas são verdades cruas que nenhum cartaz consegue disfarçar.

P.S.: Na impossibilidade de se encontrar o cartaz da JS para ilustrar este post, servimo-nos, em homenagem ao título, do anúncio da Channel com a nossa amada Keira Knightley -perdoem-nos.