Tive a ocasião de, na semana passada, entre exames e trabalhos, ler um dos clássicos da nona arte, Watchmen, de Alan Moore e David Gibbons, evereste dos comics americanos, desconstrução moderna, de realismo bruto, das estórias de super-heróis, obra cuja grandeza nem eu mesmo, por ora, consigo apreender totalmente. Gostaria de lhe dedicar a crónica, mas seria difícil justificar essa escolha egoísta perante o leitor, com todos os acontecimentos da semana passada. A crónica, porém, poderia bem copiar o início da BD, com uma estranha personagem desfilando um cartaz avisado e avisando, a lançar o tom do que se segue: o fim está próximo.
Quem me conhece, sabe como, mascarado de Nostradamus, prevejo regularmente para 2052 o fim do mundo. Conto a anedota com sucesso em vários jantares de gala, mas ninguém me acredita e em vão prego a minha escatologia barata. Esta consciência permanente do fim, dizia-o Steiner, é dos nossos traços mais distintivos enquanto europeus: mas, coisa triste, parece que hoje já não há muita gente interessada em ser europeu – perguntem aos irlandeses. Sócrates, abatido, chora em São Bento: lá se foi o tratado “porreiro” que era “fundamental para a minha carreira”. O não irlandês cria, de facto, uma situação embaraçosa: se, ignorando o referendo, os líderes europeus resolvem (e parece ser isso que se cozinha) avançar com o Tratado na mesma, mais razão terão os críticos do texto quando rabujam contra a falta de democracia no processo de ratificação do bicho, que dizem amamentado em secretárias ministeriais, longe do povo. Por outro lado, a Europa, obesa de vinte e sete países, precisa de agilizar as velhas instituições, para bem de todos eles, e Lisboa era uma efectiva possibilidade disso, quero crer. Na ressaca do referendo irlandês, conversava com um amigo meu, poeta e lúcido, desgostoso com o resultado, sobre que futuro a partir daqui para o projecto europeu, sem conseguirmos achar respostas ou consolos. No meio disto tudo, a Europa, cansada, velha, fuma um cigarro – e espera, ainda mais.
Portugal, porém, provou outros aperitivos do apocalipse. A paralisação dos camionistas, tivesse durado um pouco mais, teria deixado provavelmente o país sem pernas para andar, ou noutra perspectiva, precisamente apenas com as pernas para andar, de carro parado na garagem. Sem carta de condução e hibernado em casa a estudar para os exames, não notei as prateleiras vazias nos supermercados ou as filas para abastecer nas bombas: tudo me chegou pela televisão. Pouco me importa aqui discutir a legitimidade do protesto, mas não posso deixar de sublinhar a incompetência do governo e sua resposta tardia, demasiado tardia. Se não me demoro demais neste ponto é porque outro é o meu intuito. Por ora, ainda que nada lesta, a actuação do governo conseguiu apaziguar os ânimos e adormecer a situação. O problema, porém, será daqui a uma década e meia, mais ou menos, altura em que o preço do petróleo disparará não por causa da especulação, como agora, mas sim por, pura e simplesmente, o ouro negro começar a escassear. Um qualquer comentador, que a memória não me deixa recordar quem era, perguntava no outro dia que fizeram os governos desde o primeiro choque petrolífero, em 1973, para evitarem que, no futuro, se conhecesse a mesma situação. Seria injusto dizer que nada foi feito, mas ainda há muito, muito a fazer – e pouco, pouco tempo.
Outros sinais do apocalipse: no Zimbabwe, onde o povo morre à fome, a mulher do presidente gasta mais de 50.000€ em compras, na Itália, durante a cimeira mundial sobre a crise alimentar (piada negra do destino). Leio tudo isto e desanimo, confesso. Há quem diga que sou um pessimista incurável (e insuportável, também). Escrevia o jornalista americano George Will: “a coisa boa em se ser um pessimista é que nós estamos sempre ou a ter a confirmação de que tínhamos razão ou a ser agradavelmente surpreendidos”. Prefiro, de longe, a última opção.
Portugal, porém, provou outros aperitivos do apocalipse. A paralisação dos camionistas, tivesse durado um pouco mais, teria deixado provavelmente o país sem pernas para andar, ou noutra perspectiva, precisamente apenas com as pernas para andar, de carro parado na garagem. Sem carta de condução e hibernado em casa a estudar para os exames, não notei as prateleiras vazias nos supermercados ou as filas para abastecer nas bombas: tudo me chegou pela televisão. Pouco me importa aqui discutir a legitimidade do protesto, mas não posso deixar de sublinhar a incompetência do governo e sua resposta tardia, demasiado tardia. Se não me demoro demais neste ponto é porque outro é o meu intuito. Por ora, ainda que nada lesta, a actuação do governo conseguiu apaziguar os ânimos e adormecer a situação. O problema, porém, será daqui a uma década e meia, mais ou menos, altura em que o preço do petróleo disparará não por causa da especulação, como agora, mas sim por, pura e simplesmente, o ouro negro começar a escassear. Um qualquer comentador, que a memória não me deixa recordar quem era, perguntava no outro dia que fizeram os governos desde o primeiro choque petrolífero, em 1973, para evitarem que, no futuro, se conhecesse a mesma situação. Seria injusto dizer que nada foi feito, mas ainda há muito, muito a fazer – e pouco, pouco tempo.
Outros sinais do apocalipse: no Zimbabwe, onde o povo morre à fome, a mulher do presidente gasta mais de 50.000€ em compras, na Itália, durante a cimeira mundial sobre a crise alimentar (piada negra do destino). Leio tudo isto e desanimo, confesso. Há quem diga que sou um pessimista incurável (e insuportável, também). Escrevia o jornalista americano George Will: “a coisa boa em se ser um pessimista é que nós estamos sempre ou a ter a confirmação de que tínhamos razão ou a ser agradavelmente surpreendidos”. Prefiro, de longe, a última opção.
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