11 July 2006

A Lição de Moby Dick

Retirei-me, velho cansado, estes dias, para casa de um bom amigo meu, na banda de Leiria, entre o campo e bosque, numa pequena localidade chamada Quintas do Sirol. Em aí regressando, como que sinto sempre um prazer inédito de descobrir de novo a terra livre: conhecer a surpresa de abrir uma porta de casa e ouvir, sem sentimentalismo falso, as aves, exorcizadas pela cruz dos prédios das nossas cidades. Uma certa nostalgia de Caeiro como me invade nesses momentos súbitos. Consciencializo-me a uma escala planetária da criação dos seis dias e da penetrante beleza periclitante que lhe é intrínseca. E, relembro, triste, a citação do filme Matrix: «Os seres humanos são uma doença, o cancro deste planeta».

Neste espaço de que escrevo, quão mais bárbaras parecem as declarações de Fernando Ruas, incitando os seus concidadãos a “correr à pedrada” os inspectores do ambiente, bobamente acrescentando “medir bem as palavras” – pena não as ter pe(n)sado! Poderia concentrar-me no insulto cuspido do presidente de Viseu à inteligência comum, ao afirmar depois que não se o deveria levar à letra – num apalermado paradoxo. Podia analisar o significado do apoio imediatamente expresso de Alberto João Jardim – se valesse, da facto, ainda comentar que quer que se oiça vociferando desses lados insulares. Porém, o meu coração ofende-se mais profundamente que tudo com o pensamento excêntrico que, latente, pulsa nesta afirmação de Fernando Ruas. O poder político (numa muito provável intrusão de outros poderes poderosos) afronta o habitat do homo sapiens – criamos reservas para linces ibéricos, correctamente previstas por decreto, mas insistimos em não cuidar de nós próprios.

Penetramos aqui no instável equilíbrio entre o cidadão e o poder: obviamente, reside em nós a certeza constatada de que um esforço individual – aos mais diferentes níveis, da reciclagem à poupança de água – contribui, ipso facto, para o melhoramento do mundo; porém, simultaneamente, sabemos da importância dos poderes superiores e das suas decisões. Ajuizadamente, a tudo isto, o Ministro do Ambiente veio retorquir que aqueles “que entendem que o desenvolvimento económico é incompatível com o ambiente [...] têm uma mentalidade de desenvolvimento própria dos anos 50” – até nisto parece Portugal, anacrónico, estar a meio século de distância da Europa civilizada. A indignação do Ministro respondia também às declarações de Basílio Horta, presidente da API, pedindo para aumentar a quantidade de emissões de CO2 previstas para Portugal por Quioto: creio bem que, daqui a uns anos, aconselhará a nossa retirada deste tratado, apontando como exemplo saudável os EUA de Bush.

Internacionalmente, uma outra notícia, passada por certo despercebida – apesar do tamanho gigantesco do seu objecto, inquietou-me: a Comissão Baleeira Internacional na declaração final da sua reunião anual escreveu que a moratória que proíbe a caça à baleia desde 1986 “não é mais necessária” e, pela primeira vez em duas décadas, exprimiu o seu apoio à caça deste mamífero para fins comerciais. Tomemos consciência de que a família dos cetáceos esteve à beira da extinção – o que, atempadamente (?), levou à moratória referida. Não obstante, era do conhecimento comum a persistência do mercado negro. O levantamento da interdição pode ser fatal e encerrar a milenar história de uma das mais belas e simbólicas espécies marítimas. Os tempos passaram desde que Melville, no seu Moby Dick, louvava a perseguição dos cachalotes, mas a alegoria da obra permanece válida: indomável, Moby Dick destrói o convencido navio Pequod e o seu capitão Ahab, incapaz de entender a vitória sempre final, sempre perpétua da Natureza sobre o Homem, cego na sua ânsia de a dominar: aprendamos!

Histreta



Exames.

A palavra, curta, mas suficiente para fazer um parágrafo pelo peso. Por duas semanas longas, bicho hibernado, centrei-me concentrado – como os sumos artificiais, como é tanto do estudo que, neste tempo, se pratica – na matéria grave e sábia em que me iam experimentar. O de História era, a mim e aos como eu, aquele que mais pesadamente preocupava. Ironia do destino – e o destino tem essa virtude de ser particularmente cínico, foi o mais triste de todos.

Com novo programa, impossibilitados de utilizar os exames de anos anteriores como referência, sem qualquer prova modelo enviada pelo Ministério (apenas algumas directrizes), foi com surpresa manifesta que recebemos a aberração, entre grande formalidade de exame. Num primeiro conjunto, éramos confrontados com quatro questões semi-sucintas sobre o Estado Novo e uma de desenvolvimento. Esta última, contudo, não só era loucamente absolutizante, exigindo que nos estirássemos ao longo de múltiplas linhas – e, mais grave, minutos – como nos forçava a repetir muita informação anteriormente referida noutras perguntas.

O segundo grupo, esse, porém, é que se apresenta com todo o seu esplendor de disformidade: três perguntas referindo-se a um discurso de Kofi Annan sobre as questões transnacionais da actualidade, datado de 2004. Se o Ministério pretende com este grupo – que valia, note-se!, 70 pontos – testar a interpretação textual, só posso deduzir que, por certo, se terá enganado no exame: o de Português B talvez fora, para isso, mais eficaz. Ah!, mas esqueço-me que também este deixou aparvalhados alunos que, obrigados a decorar, à pressa, num só ano final, matéria gramatical (e que matéria!, as novidades gramaticais que já tive aqui antes oportunidade de falar), a viram praticamente excluída do exame, o qual pouco apelava aos seus conhecimentos gerais, resumindo-se a uma correcta leitura de textos apresentados.

Como estes, também os alunos de História perceberam que o que haviam estudado – ou não, já que estes assuntos, últimos no programa, tendem, consequentemente, a serem deixados de lado ou dados sob pressão e mal – de pouco lhes serviria para resolverem aquelas questões. Porém, até isso é o menos! O que, de facto, escandaliza aqui é o próprio testar destes assuntos. Considera-se, lugar-comum, que a História se pode fazer com justiça e imparcialidade volvidos trinta anos sobre os acontecimentos que se pretendem estudar. Ora a matéria de 12º vai desde o final da I Guerra Mundial até ao ano passado, incluindo acontecimentos muitíssimo interessantes como os atentados da Al-Qaeda, o Euro 2004 ou a eleição de Durão Barroso para a presidência da Comissão Europeia. Seguindo o critério referido, tal devia ser ensinado apenas em 2034 – se é se na altura ainda existir Portugal, algo de que devemos sempre duvidar.

Se já leccionar isto foi uma parvoíce, mais ainda que tal saia num exame nacional, para o qual se foi obrigado a estudar três maciços volumes para, no fim, sermos presenteados amargamente apenas com dois temas, um deles ridículo. Compara-se com o currículo anterior e o seu exame, de estrutura completamente diferente e que permitia uma muito maior cobertura do programa, abordando (tome-se o exame de 2005) o modernismo na arte, o pós-II Guerra Mundial, o 25 de Abril, a Grande Depressão, a Primeira República, entre outros. Até neste aspecto, regredimos. Mas, aliás, em todos os aspectos, enquanto país, regredimos. Descansa-me ao menos que os que se me seguirão não terão igual exame de Histreta (Históra+Treta), mas novo (provavelmente, também sem prova modelo...). Só posso reiterar o que escrevia Eça n’Os Maias (aplicação de conhecimentos do estudo para os exames): «Isto é um país impossível!»

Metamorfose Incompleta IV


Concluímos, nesta crónica, a revisão dos avanços e recuos na educação portuguesa, no fim deste primeiro ano socrático, comparando com o que antes tínhamos proposto.

A última das minhas propostas era o fim de todas as reformas educativas a médio prazo. A OCDE apontou, para explicar os resultados portugueses insatisfatórios, a instabilidade governativa na pasta da Educação: 27 ministros em 30 anos. Cada um com a sua reforma, como uma senhora chique que se faz acompanhar, ao descer à rua, do seu cãozinho. Não nego que algumas possam ter sido proveitosas, mas esta espiral instaurou um mal-estar profundo na comunidade educativa. Note-se: eu apanhei uma nova reforma; aqueles que me precederam tiveram a sua própria; aqueles que, para o ano, tomarão o meu lugar, têm já uma nova.

Às propostas que em tempos idos lacei, acrescentaria outra que, cada vez mais, se me tem imposto com vital para um rendimento escolar saudável e que a OCDE veio reiterar: corpo docente mais estável. Em Portugal, dizem as estatísticas, um terço dos professores muda de estabelecimento de ensino todos os anos. Para além de prejudicar fortemente as vidas pessoais dos docentes, afecta ainda os alunos que, a meu ver, em cada ciclo, deviam ser acompanhados pelo mesmo conjunto de professores, ou seja, do 5º-6º, do 7º-9º e do 10º-12º. Eu tenho essa experiência, escolas de sucesso têm-na, e, são benéficos os efeitos duma tal política.

Claro que, a ameaçar esta estabilidade docente, aparece o novo diploma que a senhora ministra quer fazer aprovar, onde se pretende que os pais avaliem os professores, os tais, que, nas palavras da mesma, parecem ser os únicos responsáveis pelo insucesso escolar. Plagiando um filme francês, onde um rapaz perguntava a uma rapariga, que lhe respondia afirmativamente, se cria no amor à primeira vista, eu, tal ele, depois, replico «Ingénua». De facto, muito naïv deve ser a ministra senhora para diabolizar assim os docentes, esses mesmos que, como mostrou uma reportagem recente da televisão pública, estão, em muitos sítios, em estado de sítio. Ao entregar a avaliação a uma das facções do processo educativo (os encarregados de educação), vicia todo o sistema. Era como se, suponhamos absurdamente, o BE fosse encarregue de ajuizar sobre o PSD. Os pais, esses mesmos que, na maioria dos casos, se demitiram da educação dos filhos (veja-se quantos respondem às convocatórias escolares), obviamente tenderiam para a parcialidade, no grosso das situações, como é facilmente entendível. Avaliem os professores: mas que o trabalho seja feito por uma comissão neutra, também conhecida por independente.

Os professores, esses, face a tantos ataques sistemáticos, falaram na possibilidade de uma grave greve que abarcaria os dias dos exames nacionais. Sei que balbucio “Razões de quem parece que é suspeito”, como dizia Camões de Baco. Enquanto finalista, sei da fragilidade da minha posição nesta matéria, por inevitavelmente surgir como tendenciosa, por muito que eu clame a sua neutralidade. Que um grupo (professores) prejudique outro (alunos), quando a única razão de existência dos primeiros é educar os segundos, parece-me reprovável e revela que, em Portugal, não se combate pela educação, mas por interesses de classes.

O relatório da OCDE vem-nos relembrar o verdadeiro objecto da justa luta. Diz: “Apesar de não ser o discurso oficial, a retenção dos alunos é uma prática frequente e tida como a principal ferramenta para corrigir as lacunas na aprendizagem”. Ai!, quem me dera poder chumbar o Ministério da Educação!

Metamorfose Incompleta III

Continuamos a nossa análise, à luz das conclusões do relatório da OCDE, do que, no primeiro ano do executivo socrático, foi feito na área da educação, em comparação com as propostas que avançámos há um ano neste mesmo espaço.

Salientámos então a importância da obrigatoriedade da creche. Obviamente, continua por realizar. Por sua vez, o que então me motivou a inclusão desta reivindicação (que opunha à decisão ministerial de prolongar a obrigatoriedade do ensino até ao 12º ano) parece ter caído no esquecimento. Sobre este projecto do governo, diz a OCDE que não passa por aí a solução, já que poucos são os países que adoptaram essa estratégia. Acresce que se deve continuar a apostar na diversificação do secundário, investindo no ramo tecnológico. Este é, de facto, dos mais bem conseguidos e desenvolvidos do nosso país, razão de orgulho para nós (recordo a recente parceria estabelecida pela Vasconcelos Lebre com a Alemanha). O que, hoje, porém, me arrisco a defender é que esta via técnica se inicie muito antes, isto é, que, enquanto opção, seja disponibilizada logo desde o terceiro ciclo. Isso permitiria a muitos alunos – francamente desmotivados, que se arrastam pelo básico até aos 16 anos – seguir uma via profissionalizante que melhor os serviria e os manteria na escola, com mais interesse e, consequentemente, menos abandono. Esta deserção é um dos mais dramáticos fenómenos registados pelo relatório da OCDE, que pareceu ficar chocada com o facto de que aqueles que não acabam os estudos não têm dificuldades de trabalho, pelo contrário, a taxa de emprego é mais elevada para estes do que para os que concluem o secundário e mesmo para os licenciados. Que estes têm emprego é cada vez mais um mito.

Uma das outras bandeiras que levantava era a obrigatoriedade dos exames nacionais no termo dos vários ciclos de educação. Desenterrei esta preciosa frase da senhora ministra, proferida no início das suas funções: “É preciso ter consciência de que [os exames] avaliam apenas uma parte das capacidades dos alunos. Não avaliam coisas como a oralidade.” A frase põe o dedo na ferida, achando – eureka! – o busílis de toda a examinação das línguas estrangeiras. O que falta exactamente nos exames de, por exemplo, inglês, francês ou alemão é a avaliação da oralidade no seu duplo sentido: do falar e do ouvir. O conhecimento de uma língua não pode ser somente mudo (ler e escrever). Este é um dos vários pontos críticos a reformular nos exames. Porém, hoje, com a extinção gradual dos exames levada a cabo pela senhora ministra, mais importante que reformulá-los, é mesmo mantê-los.

Quanto à forte redução da carga horária, o Público de dia 28 de Abril tinha uma magnífica carta de leitor, onde, com toda a clareza, se apontava este problema como a causa maior do insucesso escolar e se acusavam os responsáveis pela perpetuação deste sistema em que os alunos do básico chegam a ter 15 disciplinas(!): os sindicatos (que, obviamente, não pretendem a redução do horário lectivo pois isso implicaria menos empregos) e as associações de pais (que querem as escolas abertas o maior tempo possível, pois não têm onde deixar os filhos). Os dois lobbies conjugados, ao qual se parece associar o próprio governo (não esqueçamos o adiamento da hora de saída na primária decretado por esta ministra), resultam na visão, comum a tanto bons como maus alunos, da escola como uma prisão. Só nenhum dos condenados compreende o crime que cometeu...

Metamorfose Incompleta II


Continuo o balanço, à guisa de avaliação, do último ano de políticas ministeriais educativas, iniciado na última crónica, recordando os pontos importantes da reforma necessária.

Um era a efectiva intervenção do Estado como órgão controlador do preço e qualidade dos manuais. Eis que, finalmente, estão em discussão pública projectos reformistas neste sentido. A 13 de Abri, o Governo aprovou o novo regime dos manuais escolares (no âmbito do qual se inscrevem as reformas já referidas no ponto anterior). O executivo anunciou que, a partir do fim da legislatura, 2009, os alunos carenciados verão os seus manuais pagos na totalidade. Não pretendo que o governo pague a íntegra dos manuais a todos os alunos, mas é preciso que estabeleça tectos mais apertados para travar o verdadeiro saque levado a cabo pelos editores. Talvez então, estes abandonassem cadernos e cadernetas que anexam aos livros, sem verdadeira utilidade senão torná-los ainda mais caros. As medidas aprovadas estipulam que o secundário passe a ser incluído no regime de preços convencionados, levando à descida do mesmos, regime que vigorava, até agora, só no básico. Os alunos, em nome dos pais que lhes pagam os livros, agradecem. O diploma prevê ainda que a escola, no exercício da sua autonomia, tenha a possibilidade de emprestar manuais, medida que vigora, por exemplo, na Alemanha.

Quanto à questão qualidade, o diploma supra-referido institui uma comissão que funcionará como entidade competente de aprovação dos livros. Aquilo que, fora eu outro, poderia, com toda a facilidade, qualificar de uma violação grosseira da liberdade, como o estão a fazer os editores (que classificam a medida de «estalinista»), não o é. Há quem diga que tal matéria (selecção dos manuais) devia caber às escolas, no quadro da sua autonomia, porém, note-se que a comissão de peritos não vai escolher os livros e impô-los, tão somente filtrar os de qualidade inferior. Os professores continuam a escolher, mas de um lote menor, onde ficam os melhores (volto a recordar que há editoras que chegam, para o mesmo ano, a ter dois manuais à escolha: absolutamente absurdo). Lia-se no PúblicoDo universo de livros certificados, os docentes de cada escola ou agrupamento poderão seleccionar os manuais que mais se adequam ao seu projecto educativo do respectivo estabelecimento.”: é inequívoco que a liberdade de opção não fica ferida.

Insiste, criticando, Vasco Teixeira, representante dos livreiros, “Não são dois ou três especialistas sentados num gabinete que vão saber o que precisam os alunos e professores espalhados desde o interior ao litoral e regiões autónomas”. Eu pergunto: e são dois ou três autores contratados para a feitura de o manual que o saberão? Bem vistas as coisas, quem define os manuais é um grupo não restrito, mas restritíssimo. O governo assegura que o objectivo da comissão é assegurar “a conformidade dos manuais escolares com os objectivos e conteúdos dos programas ou orientações curriculares em vigor” e promover “a elevação do seu nível científico-pedagógico“. A ser cumprido o que está no papel, só posso subscrever, com uma assinatura grande, mostrando o meu orgulho em, pela primeira vez, sair uma medida inteligente do Ministério nesta legislatura.

Quanto à mudança profunda dos programas, as minhas razões de queixa não se mantêm: agravaram-se. Como descrito numa outra crónica há pouco tempo, a reforma que na minha sombra cavalga parece que só veio agravar o fosso entre a inteligência e o sistema de ensino português – vergonhoso.

Metamorfose Incompleta I


Há pouco mais de um ano o governo de José Sócrates entrou em funções. Há um ano eu escrevia, neste espaço, um conjunto de dez medidas que urgiam em nome da saúde do sistema de educação. Hoje, um ano depois, chegaram os resultados do relatório da OCDE, que muito discorre sobre o problema do nosso ensino. À boleia, voltaram à tona os problemas estruturais: muito, ultimamente, se tem discutido sobre eles. Volvidos estes 365 dias, parece justo fazer um balanço daquilo que então chamei a lição da educação, recapitulando o que, então, em jeito de manifesto, sugeri: para constatar, triste, a metamorfose incompleta do ensino.

Começava por pedir a redução do número de alunos por docente. Afirma a OCDE a necessidade de aumentar as turmas, baseando-se nos números que evidenciam o desperdício de recursos na Educação Portuguesa, em que 93,4%(!) da despesa se destina à remuneração dos professores. Indirectamente, o que se pede é a redução do pessoal docente: contribuição ao desemprego. “Assim será possível ter melhores condições materiais e fiscais de ensino, sem aumentar o custo por estudante”, lê-se. Contudo, existem outras condições, para além dessas, necessárias à boa aprendizagem e um número reduzido de alunos ajuda a que a aula renda mais. Se o digo, não é para banalizar mais o lugar-comum, mas porque, pela experiência, o confirmei: feita a razia de alunos que, pelo caminho do secundário, vão reprovando ou desistindo, chegado, enfim, ao 12º, é translúcido o melhor aproveitamento de cada colega que me acompanha. O processo de redução das turmas é, aliás, um natural, porque, como o próprio relatório da OCDE confirma, a natalidade diminuiu fortemente, o que – notam-se já os seus efeitos – leva a menos alunos, o que, mantendo o mesmo número de turmas, conduz obviamente a turmas menores.

Porém, não podemos evitar meditar nos números assustadores com que o relatório nos confronta, no que toca ao desperdício de recursos (materiais e humanos). Obviamente, tenho de concordar com a análise quando diz que as regras dos aumentos salariais e promoções têm de ser revistas (o princípio de contenção salarial, no cenário generalizado de crise, é certo em todos os sectores, de resto). Inevitavelmente, também, terá de haver despedimentos ou, diz a OCDE, recolocamento de professores noutras carreiras (e tudo isto me levanta sérias dúvidas sociais...).

Outra das questões que mais me mobilizava era o fim da multiplicidade de manuais escolares para uma maior homogeneidade. A 13 de Abril, o governo aprovou um novo regime para os manuais escolares, com significativas alterações. A ministra critica a “proliferação de títulos no mercado, impossibilitando o efectivo controlo da qualidade por parte das escolas e dos docentes". O diploma mencionado prevê o prolongamento da vida dos manuais de 4 para 6 anos. Para além de reduzir os custos das famílias mais numerosas, contribui positivamente para o que aqui defendemos. Àqueles que criticam, acusando que os manuais de História ficarão desfasados, chamo a atenção para que nunca, na prática, professor algum dá qualquer matéria que envolva os últimos 6 anos, para além de que, se trata de um período do qual, quer quem lecciona, quer quem aprende, está ciente, porque lhe é contemporâneo. Para outras disciplinas, a crítica torna-se inviável: Matemática, por exemplo, tem um currículo inalterável; Português, idem aspas, qualquer língua, o mesmo. Ciências é, ainda, o domínio mais problemático, mas, nessa área, qualquer ano é tão cheio de tanta novidade que seria necessário anualmente fazer novos livros de texto. Todavia, para toda uma maioria de disciplinas, o projecto governamental tem todo o sentido.