13 March 2005

Semana Passada

Há semanas atribuladas que merecem ser contadas. Desculpem-me os leitores esta crónica se debruçar sobre a minha vida pessoal, mas julgo que os três acontecimentos que narrarei a seguir são fortes em mensagem.

Na minha escola, encontrava-me ligado à Associação de Estudantes, ocupando o cargo de director do jornal escolar, um projecto promovido pela lista que actualmente detém o poder. Aconteceu que dinheiro desapareceu, o que causou, naturalmente, um clima de desconfiança geral entre todos os membros da lista. Com um grupo significativo, evocando falta de unidade e condições para prosseguir o trabalho, demiti-me. Foi um acto que me custou bastante. Crera eu ali achar mudança, honestidade, humildade – essas palavras chaves que tanto haviam sido apregoadas durante a campanha. Fiquei defraudado. Mais isto me convenceu do lugar-comum que é o dito de que o poder corrompe. Não há poder que não se constitua que entre os honestos não tenha os corruptos. Todo o poder é uma desilusão.

Um amigo meu foi ao Dia da Defesa Nacional na terça, respondendo às suas obrigações enquanto maior e cidadão masculino do estado português. O que ele me relatou, que eu já em anos passados ouvira doutras bocas, reclama ser descrito e tornado público para que se conheça claramente o absurdo e truanice que em tal dia são praticados. Começa o quadro do dia com o degredo da juventude nacional, embebida e embebedada em Licor Beirão, cumprindo um “dever nacional”, assim lhe chamariam os oficiais que os interpelaram a consumirem bebidas alcoólicas nacionais. Mas os sábios conselhos dos nossos oficias não se cingiram a esta recomendação, exortando os jovens a se aproveitarem de jovens estrangeiras para lhes mostrarem como o nosso país é bom. Sim, que – como disse outro oficial – “o nosso país é pequeno, pobre e feio, mas é dever nosso protegê-lo.” E vejam, leitores, qual a qualidade daqueles incumbidos de tal missão... A acrescentar a tudo o já contado, há o uso repetido de linguagem explícita, grosseira e baixa, tanto por parte de oficias masculinos como femininos – viva a igualdade dos sexos! E, por fim, no arrear da bandeira, depois dum aviso sonoro para que todos respeitassem o símbolo máximo da nação, ainda a bandeira não está toda descida, e um oficial se começa a rir, e com ele, todos, exército e mancebos. É esta a comédia do Dia da Defesa Nacional.

A tragédia da vida é outra. Uma colega que me era muito querida anunciou-me, a mim e a outros colegas, que vai ter de abandonar a escola para ir trabalhar e assim ajudar a mãe. Deixa para trás os seus sonhos, os palcos de teatro que ela tanto queria conquistar e tão bem o fazia, numa arte e mestria incomparáveis! De tudo abnega pela mãe, por decisão própria, sem que ninguém a tenha obrigado. São pessoas como ela que me fazem crer que ainda existe algum bem no mundo, que nem todos os corações humanos são podres e insensíveis, de que o altruísmo – o heroísmo! – ainda é possível nesta terra decadente. O seu gesto foi uma das mais poderosas lições de moral e vida que algum dia me pregaram. Que eu saiba aprender com ela na memória saudosa da sua pessoa que nunca me deixará. Obrigado por tudo, Cláudia! o corvo

Publicado a 16 de Março de 2005

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