Procurando evitar desagrado igual quando o primeiro-ministro, dois dias depois, fosse à Covilhã, alguém, vigilante (e anónimo), mandou, na manhã seguinte, dois polícias visitarem a sede do Sindicato dos Professores da Região Centro, donde levaram algum material de divulgação da acção de protesto prevista e autorizada para o dia seguinte. A governadora civil de Castelo Branco veio logo esclarecer que esta se trata de “uma actividade rotineira da PSP”. Julgava eu – erradamente, vejo – que a função normal das forças da autoridade era não tanto controlar o exercício da liberdade, mas antes garantir a segurança dos cidadãos. Oficialmente, essa foi, de facto, a justificação: a diligência foi destinada a averiguar situações com “significado para a segurança” do primeiro-ministro, e o próprio Corpo de Segurança Pessoal deste foi contactado. Calculo que pouco importará o facto de a manifestação nem sequer ter sido convocada pelo sindicato dos professores mas sim pela União dos Sindicatos de Castelo Branco.
Em parte, estes ataques aos sindicatos de professores já tinham sido anunciados pelo primeiro-ministro, a 5 de Outubro, quando sublinhou que “o governo não ataca os professores”, afirmando ser necessário não confundir “professores com sindicatos”. Daqui se subentende que quem é então atacado são os sindicatos. Aparentemente, o problema é estes confundirem “o direito à manifestação com o insulto”, como acusou Sócrates em Montemor. O Ministro da Administração Interna, Rui Pereira, veio já esclarecer que “é preciso ter cuidado com o tipo de palavras que se colocam nas faixas”, porque “não se pode insultar as pessoas”. Toda esta insistência no insulto recorda-me demasiado o caso Charrua: lembram-se?
Questionado sobre o caso Covilhã, o secretário de Estado adjunto da Administração Interna afirmou que “se começamos a sustentar que na aplicação da lei, em relação a quaisquer manifestações ou expressões críticas ou de aplauso, há uma margem para se extravasar a lei [...] abre-se a porta para situações que podem ser melindrosas e depois exigirão medidas de correcção de intensidade maior”. Assusta-me imaginar o que possam ser estas “medidas”. Por sua vez, interrogado sobre o sucedido na Covilhã, Sócrates aconselhou a “esperar pelos resultados” do inquérito. A espera foi curta: menos de uma semana depois, o caso foi convenientemente arquivado sem resposta e sem vergonha. Tudo indica que a acção dos polícias não foi ilegal. Não sei como reagir: se fique descansado, por tudo ser conforme a lei; se fique inquieto, por a “lei” o permitir.
Recordo aqui uma estória grega, para explicar a origem do género cómico, segundo a qual certos camponeses atenienses, cansados da exploração de que eram alvo por parte dos habitantes da cidade, se dirigiram a Atenas e, aí, insultaram abertamente aqueles que os oprimiam. Contudo, temendo retaliações futuras, prudentes!, mascararam-se, para não serem identificados. Talvez seja tempo de os manifestantes portugueses, como os gregos, começarem, neste jogo de máscaras e hipocrisias, também eles, para sua segurança, a mascararem-se...
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