25 August 2007

A Sociedade Aberta e Seus Inimigos - Parte III

Concluímos nesta crónica a enumeração das figuras que representam, pelas suas acções, uma ameaça para a sociedade aberta. Os seus dois detractores que aqui apresentamos têm em comum a tentativa – inédita entre os demais que aqui temos vindo a indicar, cujos poderes, escassos, tanto não permitiam – de controlar/silenciar os media, o dito “quarto poder”.

4) Rui Rio, Presidente da Câmara do Porto. Reconhecemos ser estranho, num jornal local, criticar a actuação do presidente de uma câmara que nem pertence ao nosso distrito. Perdoe-nos o leitor esta pequena heresia, mas sentimos que, na lista que temos vindo a fabricar, a omissão de Rui Rio descredibilizá-la-ia, porquanto isso equivaleria a encobrir alguém que, pelo seu comportamento, provou já repetidamente não aceitar com especial agrado o exercício da liberdade. Alguns, dotados de memória – um bem cada vez mais raro e subestimado hoje –, lembrar-se-ão de quando o presidente da câmara do Porto atribuiu subsídios aos agentes culturais da cidade mediante a condição expressa de estes não criticarem o executivo camarário: ei-la!, a lealdade, de novo, tão querida aos inimigos da sociedade aberta! Também antigo é o diferendo mantido com o Jornal de Notícias e o Público: contra-ataca o primeiro no site oficial da câmara e o segundo nos “direitos de resposta” que, ao abrigo da lei, faz publicar; ambos em termos tão aguerridos que devem, ao observador atento, causar desconfiança. Esta não disfarçada “oposição à oposição” ganhou atenção mediática, porém, quando, no dia seguinte ao da manifestação “silenciosa” frente ao Rivoli, o site da câmara publicou um texto, onde noticiava, em tom nitidamente crítico, a participação de David Pontes, director adjunto do JN, no dito cujo protesto. O facto de um munícipe, no exercício legal dos seus direitos de cidadania, ser denunciado no site camarário – uma aberração numa sociedade aberta – parece, contudo, inteiramente justificável a Rui Rio, porque «pode ajudar a explicar muita coisa». Certamente que sim: explica toda a razão que o JN tem nas críticas que tece a este executivo. Porém, mais revoltante é que, sem consentimento do próprio, David Pontes foi filmado a participar na “manif” e o vídeo foi colocado online, a acompanhar a notícia que registava o caso no site. Este gesto representa um atropelo inominável de um dos mais básicos direitos do sujeito: o direito à imagem. Há algo de Big Brother na atitude. Note-se, por fim, que, apesar de o site da câmara criticar o director adjunto do JN pela participação na manifestação, não se faz qualquer referência à realização desse mesmo protesto, que contou com mais de mil pessoas. Confusos? Nós, pela nossa parte, estamos bastante elucidados.

5) José Sócrates, Primeiro-ministro. Sócrates figura nesta lista por demérito próprio e não apenas pela complacência para com os “erros” dos seus ministros que demonstrou no último sábado no Parlamento: o debate foi profundamente revelador ao não revelar nada. O engenheiro sem Ordem pôs ainda em tribunal, recentemente, o autor do blogue Do Portugal Profundo, aparentemente por difamação e denúncia caluniosa. O assunto da licenciatura de Sócrates, continuando nebuloso, mostrou, porém, um primeiro-ministro que, na ânsia de afastar de si as suspeitas, acabou por se contradizer (logo quando mandou retirar, do site do Governo, o título de engenheiro) e contradizer também documentos que depois vieram a público, falhando em esclarecer o caso completamente. Porém, eis agora António Caldeira, que sempre deu a cara – ao contrário de tantos outros –, processado, por ter, com a questão da licenciatura, destruído, definitivamente, o estado de graça do primeiro-ministro. Que Sócrates procura refrear os media vê-se, por exemplo, no novo Estatuto dos Jornalistas. Nesta «festa da democracia», espero eu, agora, não levar também com um processo em cima! ■ o corvo

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