Aqueles de boa memória lembrar-se-iam, quiçá, ainda do nome de Bali, na Indonésia, dos atentados de há seis anos atrás, encravados entre os dois onzes, o americano e o espanhol. A cidade esgueirou-se de novo para as bocas do mundo graças à cimeira climática que aí decorreu durante a primeira metade de Dezembro. Porque, pela primeira vez, todos os países – mesmo aqueles em vias de desenvolvimento ou até manifestamente pobres – se uniram para redigir um acordo comum, esta conferência revestia-se de especial importância.
Eram grandes as expectativas – ao nível da importância da coisa. Os jornais, para medo nosso, iam anunciando as dificuldades nas negociações, e, pouco a pouco, a esperança redundou na desilusão. Uma ligeira nota de rodapé, dizem, resgatou o acordo, permitindo o chamado Roteiro de Bali. A pressão dos EUA, secundados por alguns países de considerável poder, nomeadamente o Japão e o Canadá, impediu o estabelecimento de metas concretas: tudo isso foi empurrado, como um camelo pelo buraco de uma agulha, para a tal nota de rodapé em que se alude às páginas do relatório do IPCC (Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas) onde se avançam – aí sim – os números que alguns quiseram esconder.
Não são algarismos agradáveis: pede-se aos países desenvolvidos que reduzam até 2020 os seus gases entre 25 a 40 porcento e a todas as nações que, em 2050, as emissões de CO2 sejam metade das actuais. Porém, a não enunciação explícita destes números no documento final limita-o bastante, tornando-o essencialmente num manifesto de boas intenções, e não permite, de modo nenhum, proclamações de vitória. O ambiente é um assunto por demais sério, cuja gravidade ainda não foi totalmente apreendida por todos. Tem-se trabalhado e não negarei os avanços feitos (veja-se, por exemplo, entre nós, o sincero triunfo das campanhas de reciclagem), mas, se ainda há alguma esperança, mesmo se mínima, de ganhar esta luta, ela exige ainda mais de nós, insatisfeita com os progressos registados.
Alguns estar-me-ão já a rotular de pessimista. George Steiner, no seu ensaio A Ideia de Europa, afirmava mesmo que um dos traços definidores do nosso continente é precisamente esta consciência aflitiva de um fim iminente. Talvez, portanto, o meu pessimismo não seja mais do que uma consequência do meu ser europeu. Não deixa de ser curioso que seja precisamente a União Europeia quem mais pugna pelas causas ambientais. Pelo contrário, os EUA, nos últimos anos, têm-se revelado, neste campo, uma força de bloqueio. Isto, porém, sob a batuta de Bush: também por essa razão, entre outras, as eleições americanas em Novembro são, possivelmente, o acontecimento político mais importante deste novo ano.
Nem todos, porém, se encontram necessariamente solidários com esta luta pelo ambiente. Há quem, receoso da mudança, procure proclamar, mesmo se a medo, que o combate contra o aquecimento global pode ameaçar a paz, como o director do Público, defendendo que o crescimento económico, que as metas do IPCC põem em causa, é o que sustenta a actual paz. Esta é uma argumentação sem dúvida original – mas débil, que menospreza o que está verdadeiramente em questão: a nossa sobrevivência enquanto espécie.
O Prémio Nobel da Paz deste ano (perdão, do ano passado) foi para o IPCC (tomo a liberdade de não mencionar Al Gore). A tarefa do IPCC tem sido repetidamente relembrar-nos a bomba-relógio cuja desactivação teimamos em adiar, armados em James Bond, confiantes de que, como sempre nos filmes do espião, no último segundo, silenciaremos o mortal tique-taque. No fundo, o que este Nobel nos lembra é a dinamite sobre a qual caminhamos: que tenhamos isso sempre presente ao longo deste novo ano.
Não são algarismos agradáveis: pede-se aos países desenvolvidos que reduzam até 2020 os seus gases entre 25 a 40 porcento e a todas as nações que, em 2050, as emissões de CO2 sejam metade das actuais. Porém, a não enunciação explícita destes números no documento final limita-o bastante, tornando-o essencialmente num manifesto de boas intenções, e não permite, de modo nenhum, proclamações de vitória. O ambiente é um assunto por demais sério, cuja gravidade ainda não foi totalmente apreendida por todos. Tem-se trabalhado e não negarei os avanços feitos (veja-se, por exemplo, entre nós, o sincero triunfo das campanhas de reciclagem), mas, se ainda há alguma esperança, mesmo se mínima, de ganhar esta luta, ela exige ainda mais de nós, insatisfeita com os progressos registados.
Alguns estar-me-ão já a rotular de pessimista. George Steiner, no seu ensaio A Ideia de Europa, afirmava mesmo que um dos traços definidores do nosso continente é precisamente esta consciência aflitiva de um fim iminente. Talvez, portanto, o meu pessimismo não seja mais do que uma consequência do meu ser europeu. Não deixa de ser curioso que seja precisamente a União Europeia quem mais pugna pelas causas ambientais. Pelo contrário, os EUA, nos últimos anos, têm-se revelado, neste campo, uma força de bloqueio. Isto, porém, sob a batuta de Bush: também por essa razão, entre outras, as eleições americanas em Novembro são, possivelmente, o acontecimento político mais importante deste novo ano.
Nem todos, porém, se encontram necessariamente solidários com esta luta pelo ambiente. Há quem, receoso da mudança, procure proclamar, mesmo se a medo, que o combate contra o aquecimento global pode ameaçar a paz, como o director do Público, defendendo que o crescimento económico, que as metas do IPCC põem em causa, é o que sustenta a actual paz. Esta é uma argumentação sem dúvida original – mas débil, que menospreza o que está verdadeiramente em questão: a nossa sobrevivência enquanto espécie.
O Prémio Nobel da Paz deste ano (perdão, do ano passado) foi para o IPCC (tomo a liberdade de não mencionar Al Gore). A tarefa do IPCC tem sido repetidamente relembrar-nos a bomba-relógio cuja desactivação teimamos em adiar, armados em James Bond, confiantes de que, como sempre nos filmes do espião, no último segundo, silenciaremos o mortal tique-taque. No fundo, o que este Nobel nos lembra é a dinamite sobre a qual caminhamos: que tenhamos isso sempre presente ao longo deste novo ano.
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