Confesso, sinceramente, que não tenho um tema para esta crónica. Sentei-me na cadeira, li os jornais da semana de lés a lés e só confirmei a velha sentença do Eclesiastes 1.9: “nada há, pois, novo debaixo do sol”. Algum leitor pode ficar espantado com a arrojada afirmação. Houve nada menos que três eleições (Madeira, França, Timor), outras foram prometidas (Lisboa) e uma criança desapareceu (Algarve). Porém, a vitória de Ramos-Horta era adivinhável, a de Sarkozy expectável e a de Jardim inevitável. Rói-me um medo por dentro sussurando-me maledicente as palavras d'O Leopardo de Lampedusa: “é preciso que alguma coisa mude para que tudo fique na mesma”.
Carmona, filho mal-comportado, foi “expulso” do poder. Porém, no fundo, que novidade há numa câmara de Lisboa em crise e num autarca arguido – as duas coisas em risco de se tornarem um pleonasmo? Ainda recentemente, a PJ foi a Gondomar de Valentim Loureiro e Fátima Felgueiras foi acusada de eliminar elementos de acusação. E, claro, Jardim ganhou. Mas todos estes factos não significam nada, obviamente!
Por fim, o desaparecimento de Maddie tem ocupado gordamente os horários nobres dos telejornais: nem isto, contudo, é, infelizmente, novidade – Alice continua demasiado marcado no nosso espírito para que possamos esquecer isso. Porém, como o filme de Marco Martins desencantadamente revela, o interesse dos media é passageiro e superficial e, acima de tudo, desonesto, porquanto, mais do que com o drama pessoal, está procupado com as audiências baratas. A excessiva cobertura mediática do caso tem sido alvo de críticas, com muitos a sugerirem que tem sido empolado devido à origem estrangeira da vítima que tem levado a uma mobilização policial para, literalmente, inglês ver – e, mesmo assim, como o revelam os tablóides britânicos, o inglês não está contente.
A leste (e a oeste), nada de novo, portanto. Encontrei, na minha pesquisa, reconheço, meia dúzia de notícias engraçadas, insuficientes para fazer uma crónica. O primeiro prémio da bizarria é arrecadado definitivamente pelo Hamas que, durante um mês, terá mantido um programa infantil semanal de apologia à resistência armada, cujo apresentador se vestia como o Rato Mickey. Recomendo uma busca rápida no YouTube para ver excertos das aterradoras emissões. O problema dos fundamentalismos atingiu uma tal dimensão que, veja-se!, o Grande Oriente Lusitano organizou um encontro em Lisboa para debater a questão, isto numa altura em que o Serviço de Informações e Segurança confirmou que terroristas, inclusive da Al-Qaeda, têm usado Portugal como país de passagem, fraude e falsificação de documentos.
Por cá, o troféu da bizarria vai para a Segurança Social, que exigiu a uma mulher, dada como morta pelo sistema há sete anos, que provasse estar viva, por meio de certidão. O absurdo é, todavia, mitigado por um mea culpa já assumido. Ao mesmo gesto de retractação não se prestou o Tribunal da Relação de Coimbra, cujo acordão sobre o caso do sargento Luís Gomes é chocante, referindo-se ao militar como “actor-encenador privilegiado do teatro da vida da criança-vítima”, acusando-o de ter forjado um “mundo de encantamento”, uma “ficção de realidade familiar”, induzindo na menor “laços de amor”, “criando-lhe uma personalidade para o futuro, como se de animal de estimação se tratasse”: tudo pelo “interesse pessoal e egoísta de ter um filho”. Não se trata de emitir aqui qualquer juízo sobre o caso – o qual, de resto, nem tenho acompanhado muito de perto – mas sim de constatar o teor do texto.
Mas que a Justiça está mal também não é, enfim, novidade. O mundo está monótono. Abriu esta semana, em Lisboa, uma delegação de Dennis Hope, que clama ser dono da lua e vende terrenos no nosso satélite. Quiçá, por lá, a realidade será mais interessante. Por enquanto, preso à terra, vou ouvindo os velhos Rádio Macau , cantando, com eles, o célebre verso do refrão: “Já não há nada de novo, aqui, debaixo do sol”... ■ o corvo